No fim
de março, a analista de mercado Sandra Ratnieks, de 57 anos, acompanhou o
desfecho mais extremo do novo coronavírus em sua família: um caso grave que
acabou em morte. O marido de uma prima de segundo grau foi infectado e outros
familiares acabaram pegando a doença. Ele, que tinha 58 anos, chegou a ser internado
e parecia que se recuperaria, mas acabou morrendo após dez dias no hospital.
Um levantamento da Demanda Pesquisa e
Desenvolvimento de Marketing apontou que três em cada dez brasileiros conhecem
uma pessoa que morreu após ser infectada pela covid-19. O dado é da segunda
edição de uma pesquisa sobre o impacto do coronavírus no Brasil. O trabalho foi
realizado entre 18 e 21 de abril, quando as medidas de isolamento social já
completavam um mês para algumas pessoas. O levantamento apontou ainda que apenas
10% dos entrevistados estão ficando em casa.
Sandra tem lembranças difíceis do momento que a
família enfrentou nos últimos meses. “Foi uma situação bem triste. A
família não podia vê-lo no hospital, só conseguia contato com o médico. O pior
dessa doença é que você acha que a pessoa está melhorando e isso pode não ser
verdade. Ele estava mal e ficou estável. A gente começou a ter esperança.
Depois, veio a notícia de que ele tinha morrido. Isso dá uma angústia
grande”, atesta.
Ela diz que, na família do marido, também houve
a morte de um primo. Por causa do avanço da doença, a analista de mercado se
mudou para Itatiba, no interior paulista, para ficar mais perto do pai, que tem
84 anos. “Meu marido e meus dois filhos estão em São Paulo. Vim para não
deixar meu pai completamente sozinho. Já estava preocupada, mas, com essa
morte, a ficha cai claramente. Se eu pegar, não sei se vai ser leve, grave ou
se vou morrer. Não dá para vacilar.”
O dado sobre óbitos presente na pesquisa se
refere a casos que foram confirmados. “Muita gente já tem conhecido que
foi infectado ou, pior, que acabou morrendo. A pesquisa mostrou que 33% dos
entrevistados conhecem alguém que morreu da doença. Nós não tínhamos essa
informação na outra verificação, de março. Esse novo dado veio em abril. Isso
mostra que o coronavírus chegou perto das pessoas”, analisa Silvio Pires
de Paula, presidente da Demanda.
Outros 8% afirmaram conhecer pessoas que
morreram com suspeita de contaminação pelo vírus, mas que não foram
confirmados. A primeira morte pela doença no Brasil ocorreu no dia 16 de março,
de um homem de 62 anos, em São Paulo, e foi confirmada um dia depois.
Em relação aos casos da doença, 34% afirmaram
que amigos tiveram confirmação de infecção pela doença por exames. Em relação a
membros da família, esse número é de 7%. Outros 27% disseram que amigos e 9%
que familiares receberam diagnóstico clínico, sem a realização de testes. Entre
os que foram infectados, 1% disse ter recebido diagnóstico laboratorial e 2%
tiveram diagnóstico clínico. Para a pesquisa, foram ouvidas 1.045 pessoas de
todas as regiões do País. Elas responderam questionário online. A margem de
erro é de três pontos porcentuais para mais ou para menos.
A agente de viagem Paola Armelin Degaspari, de
38 anos, perdeu uma colega de trabalho, também agente de viagem. Aos 37 anos, a
vítima tinha acabado de dar à luz no mês de abril. Ela ajudou em uma campanha
para arrecadar fraldas, roupas e itens de enxoval para a recém-nascida, que não
foi infectada, mas nasceu prematura e está internada na UTI.
“Ela precisou ser internada, porque estava
grávida e tinha pressão alta. Dois dias depois que a filha nasceu, ela começou
a passar mal, a sentir falta de ar. Foi testada e confirmou que estava com
coronavírus. Foi muito triste e chocante.”
O empresário Rodermil Pizzo, de 54 anos,
trabalhou durante 12 anos com a agente de viagem que morreu e participou da
mobilização para ajudar a criança. Também colaborou para que a mãe dela, que
mora em Florianópolis, se despedisse da filha. “Fizeram de tudo para
salvar a vida dela. A mãe dela achava que a veria, mas só mostraram um caixão
lacrado no cemitério da Vila Formosa. Como ela trabalhou por muitos anos na
mesma empresa, as pessoas começaram a se movimentar para ajudar. Muita gente já
ajudou com sacolas de roupas e de fraldas. A gente está separando o que é
repetido para doar para outra criança que esteja precisando.”
Isolamento
Assim como na edição anterior, as pessoas se
preocupam mais em não contaminar outras pessoas (69%) do que em serem
infectadas pelo vírus (53%), mas os índices são menores do que os de março,
quando os números eram 76% e 55%, respectivamente. Por região, a que mais tem
preocupação é a norte do Brasil, que já apresenta colapsos no sistema de saúde.
“A situação de Manaus assusta muita gente”, avalia o presidente da
Demanda.
Em relação ao isolamento social, 36% dos
entrevistados consideram as medidas rigorosas e adequadas. Para 35%, elas são
brandas e deveriam ser mais rígidas. No recorte por idade, 59% das pessoas até
29 anos estão neste último grupo. “O que as pessoas estão dizendo é que
querem medidas rigorosas. Apenas 2% afirmaram que são contra todas as
medidas.”
Ocorre que as pessoas continuam saindo de suas
residências. “Apenas 10% afirmaram que não estão saindo de casa e 85%
disseram que só saem para atividades essenciais, como ir ao mercado.” Os
demais informaram que vão à rua com a mesma frequência de antes. Entre as
medidas de proteção, estão as visitas. O comportamento dos entrevistados muda
quando o quesito é convidar pessoas para suas casas ou visitá-las.
“Mais que o dobro de pessoas que não
convida para a própria casa, vai, às vezes, para a casa de outras pessoas. A
pesquisa mostra que 10% evitam, mas ainda convidam. Mas 23% afirmam que estão
frequentando a casa de outras pessoas.” Sobre os idosos, 76% dos
entrevistados afirmaram que evitam visitá-los e 26% ainda se encontram com
pessoas com mais de 60 anos.