Obra de Drummond volta em busca do público mais jovem

Foto: Riotour
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Quando lançou seu primeiro livro, Alguma Poesia (1930), Carlos Drummond de Andrade estava com 28 anos e, apesar de tímido e inexperiente, já compunha, naqueles anos de formação, “versos incomuns, de construção habilidosa, imantados pela inquietude estética e, a um só tempo, existencial que definiria sua poética mais madura”, no entender do também poeta e crítico Eucanaã Ferraz.

Pois é justamente com Alguma Poesia e outros três títulos definidores da trajetória drummondiana (Sentimento do Mundo, Claro Enigma e Antologia Poética) que a editora Record lança, em abril, uma nova edição da obra do poeta – desde outubro passado, a casa editorial reconquistou os direitos que estavam com a Companhia das Letras desde 2011.

“A escolha desses títulos revela nosso principal objetivo: apresentar a obra de Drummond para novos públicos, especialmente os mais jovens”, comenta o escritor Rodrigo Lacerda, também diretor executivo da Record. “Percorremos assim um período que vai desde o primeiro livro, que é seu cartão de visitas, até o grande balanço que ele mesmo fez de seu trabalho, em Antologia Poética, de 1962.”

De fato, já em sua estreia, Drummond revelou seu talento em versos que logo se eternizariam, como os do Poema das Sete Faces (“Quando nasci, um anjo torto/desses que vivem na sombra/disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida”). E também no bem-humorado Quadrilha (“João amava Tereza que amava Raimundo”), parafraseado anos depois por Chico Buarque.

O trabalho de reedição de toda a obra envolveu cuidados especiais – como utilizar a mesma tipologia no nome Drummond em todas as capas, como uma espécie de logomarca. “Cada volume vai trazer uma cronologia da época de seu lançamento, revelando o que acontecia no mundo três anos antes e três depois da data da primeira edição”, comenta Lacerda. “Assim, será possível identificar como Drummond refletia, em sua obra, o que ocorria ao redor.”

Lacerda lembra ainda que os livros terão um QR code que vai oferecer ao leitor desde a bibliografia completa até registros de variação que o próprio Drummond promoveu em seus poemas. Detectar essas modificações, aliás, faz parte de um trabalho de fixação que vem sendo realizado por Edmilson Caminha e Alexei Bruno.

Eles buscam deixar cada conteúdo o mais próximo possível daquele imaginado pelo poeta. Uma tarefa de formiguinha, em que as primeiras edições da obra servem como base, além de manuscritos cuja consulta foi liberada pela família de Drummond. “Corrigimos várias diferenças”, conta Caminha que, na busca incessante pela fidedignidade, já usou uma lupa para descobrir se o sinal original era uma vírgula ou um ponto.

POSFÁCIO

“São poemas monumentais, em especial os de Claro Enigma, que revelam a maturidade poética de Drummond”, observa Caminha, cuja opinião coincide com a do escritor moçambicano Mia Couto, autor do posfácio desta obra – os autores destes textos, aliás, não são essencialmente especialistas, mas artistas que compartilham suas relações afetivas com a poesia drummondiana. Outra novidade desta nova edição.

“Nos primeiros livros, Drummond encenava um confronto entre o mundo e a pessoa”, escreve Couto. “Neste livro, essa batalha é assumida como um assunto equivocado. As fronteiras que separam a realidade e o humano são fluidas e movediças. No final das contas, o homem veste-se com a pele do mundo e o mundo só existe aos olhos do humano.”

Já Antologia Poética é avaliada pela cantora e compositora Zélia Duncan, que compara a organização de poemas à construção de um roteiro de show: “Ele pisa no palco, com uma de suas mais conhecidas obras, seu primeiro abre-alas, aquela que estava em seu livro de estreia. A abertura já aterrissa consagrada, com aquele que se tornou um de seus grandes hits, o Poema de Sete Faces”.

Encarregado de comentar o livro de estreia de Drummond, o estilista Ronaldo Fraga observa: “Ele não imaginava que os poemas embalados no livrinho publicado pela Imprensa Oficial ganhariam imortalidade nos cânones da poesia em língua portuguesa e fariam com que seu autor deixasse de ser moderno para se tornar eterno”.

E o ambientalista Ailton Krenak, que cuidou de Sentimento do Mundo, traçou um belo perfil do autor: “Drummond caminha entre nós, com suas palavras gentis e gestos de indizível graça, como se evitasse fazer algum desnecessário ruído”.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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