O juiz Renato
Coelho Borelli, da 9ª Vara Federal Cível do Distrito Federal, deferiu liminar
nesta quarta-feira, 15, determinando que todas as instituições do Sistema
Financeiro Nacional se abstenham de aumentar a taxa de juros ou intensificar as
exigências para a concessão de crédito ante a pandemia do novo coronavírus.
Além disso, a decisão determina à União e ao Banco Central que condicionem a
concessão dos benefícios de liquidez aos bancos – provenientes da redução do
porcentual dos recolhimentos compulsórios – à efetiva apresentação de novas
linhas e carteiras de créditos a favor do mercado produtivo interno.
“Entendo que a inexistência de vinculação entre a diminuição do porcentual
da alíquota do recolhimento compulsório imposto às instituições do SFN, sem o
repasse de crédito para a comunidade, impõe a intervenção do Poder Judiciário,
no intuito de garantir que o ato administrativo atinja seu objetivo, permitindo
a ampliação dos recursos disponíveis para empréstimos nos bancos”,
escreveu o magistrado.
Borelli pontuou ainda que “de nada adianta a criação de norma para
ampliação de crédito, se esse crédito não circula, ficando represado nas
instituições financeiras, o que mostra a não observância dos princípios da
vinculação, finalidade e motivação que devem nortear todos os atos
administrativos”.
A decisão foi dada no âmbito de uma ação popular ajuizada pelo presidente do
Partido Democrático Trabalhista, Carlos Lupi, contra a União e o presidente do
Banco Central Roberto Campos Neto. A petição inicial argumenta que, em razão da
pandemia da covid-19, o Banco Central adotou medidas como a liberação do fluxo
de caixa dos bancos, mas estes não teriam utilizado a liberação de ativos para
disponibilizar mais crédito para o mercado nacional, “o que foi chamado
pelo Ministro da Economia como empoçamento no sistema financeiro”.
Lupi alegou ainda que diante da retenção pelos bancos dos ativos líquidos, é
necessária a “adequação e da formulação das medidas de liquidez para que
efetivamente cumpram o seu papel e não apenas financiem os bancos que operam no
mercado nacional, quando todas as verbas do governo deveriam estar sendo
direcionadas à solução das crises de saúde pública e econômica das empresas do
setor de produção e de comércio em lugar do capital especulativo represado no
sistema financeiro”.
“No caso da redução dos depósitos compulsórios, para a liberação de
liquidez para o sistema financeiro nacional, há um trade off importante de ser
considerado. É dar liquidez ao sistema econômico em troca da redução de lastro
do sistema financeiro brasileiro, se a liquidez não passa, em forma de crédito
às empresas e aos indivíduos, a medida pretensamente anticíclica vira, na
verdade, financiamento do sistema financeiro no lugar de alento interventivo
estatal à economia”, escreveu o presidente do PDT na ação apresentada à Justiça
Federal do DF.
Ao analisar o caso, o juiz Renato Coelho Borelli apontou que o Banco Central
agiu para que mais dinheiro circulasse na economia, tendo como principal canal
o aumento da capacidade de empréstimo dos bancos. “Na teoria, se há mais
recursos disponíveis para os bancos emprestarem, a tendência é que mais pessoas
peguem empréstimos e haja mais dinheiro para circular na economia. Para que
isso se concretize, no entanto, é necessário que o aumento da capacidade de
empréstimo dos bancos se traduza, na prática, em um maior número e volume de
empréstimos. Segundo as empresas, esse é o ponto onde o fluxo está
travado.”
O magistrado indica ainda que diante do cenário econômico nacional desenhado
após a pandemia, o Banco Central editou circular em 23 de março de 2020,
reduzindo o porcentual do recolhimento compulsório das Instituições
Financeiras, com o objetivo de ‘suavizar’ os efeitos causados pela quarentena,
“permitindo a obtenção de crédito por essas
empresas/indústrias/microempresários, ante a melhoria das condições de liquidez
do Sistema Financeiro Nacional”.
“Nada obstante, como afirmado pelo autor popular, até o presente momento,
a Administração não adotou medidas a fim de levar esse aumento de liquidez a
população, que ficou aprisionada nas instituições financeiras, inviabilizando o
cumprimento da exposição de motivos que fundamentou a edição da Circular BCB nº
3993/2020. Consigno, ainda, que a própria norma permite a inércia dos bancos,
pois não vincula a liberação de dinheiro público a liberação de crédito para
aqueles que forem impactados durante o período de pandemia”, registrou
Borelli.
O magistrado considerou que a melhora nas condições de liquidez dos bancos não
atendia ao princípio da vinculação, uma vez que permite o acesso a valores por
parte dos bancos, sem ‘que tais recursos sejam de fato utilizados por aqueles
que precisam, especialmente as empresas atingidas pelo fechamento obrigatório
do comércio considerado não essencial, afetando, por consequência, os
empregados dessas empresas’.
Além disso, o magistrado registrou que a circular editada pelo Banco Central
“deixou de observar o princípio da finalidade, considerando que o aumento
da liquidez dos bancos não atendeu ao fim para o qual foi criada”.
“De nada adianta a criação de norma para ampliação de crédito, se esse
crédito não circula, ficando represado nas instituições financeiras, o que
mostra a não observância dos princípios da vinculação, finalidade e motivação
que devem nortear todos os atos administrativos. Se o fundamento da Administração,
para editar a Circular BACEN nº 3.993/2020, foi a diminuição dos prejuízos
econômicos decorrentes da pandemia de COVID-19, possibilitando a oferta de
crédito para as empresas, evitando, assim, demissões em massa, a norma deve
observar estritamente o motivo de sua criação”, escreveu o magistrado na
decisão.
Borelli pontuou ainda que a edição da medida provisória 944 para incentivar a
oferta de crédito para as empresas financiarem suas folhas salariais, “não
supre as falhas decorrentes do aumento da liquidez em favor dos bancos”.
“Isso porque o Governo Federal já havia reduzido o porcentual dos
recolhimentos compulsórios a favor das instituições do SFN, e a MP nº. 944/2020
não impôs a estas instituições a destinação do dinheiro público na forma de
crédito para as empresas. Ao contrário, a referida medida provisória apenas
possibilita a adesão ou não dos bancos, além de limitar a receita bruta
daquelas empresas que poderão participar do programa.”