Violência restringe Correios em 29% de SP

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O alto índice de assaltos levou os Correios a restringirem ou até mesmo a não entregarem produtos em quase um terço da cidade de São Paulo, o que afeta a vida de cerca de 4,5 milhões de pessoas.
Há problemas na distribuição em mais da metade dos distritos da capital (57 dos 96 existentes), principalmente na periferia, onde a restrição chega a 99,96% das ruas do Itaim Paulista, na zona leste.
Os dados integram um levantamento inédito feito pela Folha com base no sistema de informações dos Correios.
A reportagem analisou a situação de entrega para 43.730 CEPs da capital paulista (só 3% do total ficaram de fora, por falhas de sistema) e detectou restrição -completa ou parcial- em 13.410.
Com base nos CEPs, foram calculados os quilômetros de ruas com algum tipo de restrição –são 29% do total. Foi estimada também a população afetada, considerando número de habitantes nos distritos.
Esses moradores normalmente não recebem em suas casas itens como roupas, brinquedos e eletrônicos.
Existem dois tipos de restrição adotados pelos Correios para locais considerados perigosos pela empresa.
Em um deles, que abrange 24% das ruas, a instituição afirma que a entrega exigirá recursos especiais de segurança, como escolta armada, o que pode mais que dobrar os prazos para entrega.
Se fizer a consulta no site da empresa, o cliente também já fica ciente de que talvez o produto não seja entregue no endereço especificado e ficará em central de distribuição para ser retirado lá.
No outro tipo de restrição, que abrange 5% da cidade, o produto não é entregue de nenhuma forma e vai direto para a unidade de distribuição.
Os locais de retirada são informados pela instituição em avisos deixados pelos carteiros nas casas dos destinatários (correspondências são entregues nessas áreas).

DELITOS
Os Correios informaram que as restrições são adotadas “levando em consideração o histórico de delitos praticados” contra a instituição.
“Periodicamente a área de segurança da empresa realiza estudos para verificar se as condições de segurança das regiões em questão voltaram à normalidade. Porém, apenas o fim da violência nas cidades permitiria a entrega convencional em todos os locais”, afirma a nota oficial.
Distritos com maior percentual de restrição nos Correios tendem a ser os que mais sofrem com roubos em geral. Na periferia da zona sul, Capão Redondo tem restrição em 98% das ruas e o segundo maior número de roubos da cidade, de acordo com dados do governo estadual.
A Secretaria da Segurança Pública da gestão Geraldo Alckmin (PSDB), responsável pelas polícias do Estado, disse que a situação não é tão crítica quanto mostra o levantamento da Folha e que roubos de carga estão em queda.

PAPAI NOEL
As agências dos Correios na periferia ficam cheias de pessoas em busca dos produtos.
É o caso de um centro de distribuição em Itaquera (zona leste), próximo ao estádio do Corinthians, usado na abertura da Copa do Mundo em 2014. Metade do distrito tem restrição total de entrega.
O autônomo César Augusto Vilas Boas de Lima, 47, que estava na unidade no último dia 21, é um dos que sofrem com a limitação do serviço.
Comerciante de produtos pela internet, Lima diz que algumas vezes envia roupas para clientes que não sabem que estão em área sem entrega.
Consumidores se revoltam com a necessidade de retirada nas agências e desistem da compra. “Preciso ir retirar na agência porque eles também não entregam no meu endereço. Às vezes nem compensa porque fica mais caro o combustível do que a peça.”
Em Itaim Paulista (zona leste), buscava produtos quatro dias antes do Natal a dona de casa Thamires de Oliveira Damatto, 28, grávida de nove meses. Estavam com ela os filhos Miguel, 6, e Bernardo, 3.
Os meninos haviam mandado cartas para o Papai Noel dos Correios (programa em que voluntários recebem pedidos feitos por crianças).
Os dois foram sorteados, mas o bom velhinho não quis arriscar. Pediu, em uma cartinha, que eles retirassem os presentes na agência.
“Eles esperavam que ao menos estivesse o Papai Noel entregando os presentes na agência, mas não tinha ninguém. Ficaram decepcionados”, disse a mãe.
Também reclamava no local o polidor de aeronaves Emanuel Gomes, 51. “Moro a 150 metros de agência dos Correios e não entregam na minha casa porque dizem que é área de risco. Fico indignado, eles não fazem a entrega de graça; cobram por isso.”

CRIMES
Os roubos de carga, aos quais se enquadram assaltos a produtos que os Correios entregam, subiram neste ano, até novembro, 10% no Estado, 1,2% na cidade e 27% na Grande SP –próxima de bairros periféricos paulistanos.
Houve uma sequência de três meses de queda no crime desde setembro no Estado, que chegou a ter 15 altas consecutivas desde junho de 2016.
Segundo Silvana Regina Azeredo dos Santos, 52, diretora do Sindicato dos Trabalhadores dos Correios, os ataques aos Correios se agravaram nos últimos dois anos.
Santos afirma que há trabalhadores que foram vítimas de roubo mais de 30 vezes.
Muitos dos funcionários, diz ela, são agredidos nesses roubos e acabam afastados do trabalho por problemas psicológicos –o que deixa ainda mais desfalcado o quadro de servidores da empresa.
“Tirando a região central, os criminosos veem os carros dos Correios e já enxergam dinheiro em caixa”, afirmou ela.

(Folhapress)
Foto: Jardiel Carvalho/Folhapress

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